terça-feira, setembro 12, 2006

Uma ampla vaga de livros nipónicos editados no Brasil nos próximos anos (I)

“Escrita que vem lá do Japão”
por Paulo Cunha
Revista “EntreLivros”, nº 17 - Setembro de 2006


"Mercado brasileiro se abre para a literatura produzida no Japão. Até 2007, editoras preparam lançamentos de autores contemporâneos - entre eles dois Prêmios Nobel -, em traduções diretas do original.

Nos últimos anos, o mercado editorial brasileiro descobriu um novo filão: a literatura japonesa contemporânea, isto é, a produzida a partir do século XIX. Nessa leva, acaba de chegar às livrarias um pacote de peso. Nele se incluem dois romances do Prêmio Nobel Yasunari Kawabata, outro do também premiado Kenzaburo Oe, e a segunda edição de Hagoromo de Zeami, uma “transcriação” de Haroldo de Campos sobre uma peça tradicional do teatro nô. Os lançamentos não devem parar por aí. Empenhada em publicar toda a obra de Kawabata, a editora Estação Liberdade anuncia mais dois livros para 2007: A dançarina de Izu e Contos da palma da mão. Também em 2007, a Ateliê Editorial lançará Trajetória em noite escura, de Naoya Shiga, com tradução de Neide Nagae. A Objetiva, que já publicou dois livros de Haruki Murakami (Minha querida Sputnik e Norwegian wood), prepara mais um para o ano que vem – comprou os direitos de Umibe no Kafka, que será lançado no Brasil com o título provisório Kafka à beira-mar. Detalhe importante entre os lançamentos é o fato de todos terem tradução direta do japonês, fato raro até então no mercado editorial brasileiro.

Depois de publicar, em 2004, O país das neves e A casa das belas adormecidas – inspiração confessa de Gabriel García Márquez para seu Memórias de minhas putas tristes –, a Estação Liberdade lança mais duas obras fundamentais de Yasunari Kawabata (1899-1972), Prêmio Nobel de literatura de 1968. Kyoto é talvez seu trabalho mais importante, que deu reconhecimento internacional ao escritor. Lançado originalmente em 1962, foi uma das últimas obras de Kawabata antes de sua morte, por suicídio, dez anos mais tarde. Chega agora com tradução do japonês de Meiko Shimon. Ambientado em Kyoto, no período pós-Segunda Guerra, narra a trajetória da jovem Chieko, filha adotiva de Takichiro, um comerciante de quimonos, e de sua esposa, Shige. Chieko trabalha na loja do pai e assiste à sua falência, como à de várias outras lojas tradicionais de Kyoto, em razão da mudança dos valores culturais, então influenciados pelo Ocidente. Para descrever a cidade que foi capital do Japão por mais de mil anos (entre 794 e 1868), Kawabata desenvolveu uma profunda pesquisa, que revela na obra aspectos culturais e costumes da região, até então desconhecidos até mesmo por japoneses. A descrição de Kawabata sobre a cidade, sua mistura de estilos, sua beleza natural e datas festivas, é pura poesia.

A tradutora, Meiko Shimon, destaca as dificuldades de passar o texto do japonês para o português. “Trazer seu mundo imaginário, escrito de uma forma um tanto vaga, muitas vezes ambígua, mas com uma linguagem bela e fluente é o mais difícil”, diz ela. Além disso, Meiko conta que Kyoto traz termos e situações tipicamente japoneses. “Não só os aspectos da cultura tradicional, quimonos, festivais, templos e santuários, habitações, costumes, como também o modo de falar, pensar e se comportar dos personagens”, diz. “Tudo isso é muito diferente para os leitores brasileiros.”

O outro título, Mil tsurus, publicado originalmente em capítulos por revistas japonesas, foi escrito entre 1949 e 1951, período marcado pela reconstrução de um Japão devastado pela guerra. Saiu pela primeira vez no Brasil em 1956, pela Nova Fronteira, sob o título Nuvens de pássaros brancos. A edição que chega agora tem tradução do japonês de Drik Sada. Fazendo da cerimônia do chá o pano de fundo da obra, Kawabata resgata valores tradicionais, justamente no momento em que o país se defrontava com valores culturais vindos do Ocidente. O livro narra a vida de Kikuji Mitani, um jovem que reencontra duas amantes de seu falecido pai, durante uma cerimônia do chá, e acaba profundamente envolvido com elas. Nessa história em que o passado, representado pela figura do pai do protagonista, desperta sentimentos em conflito, Kawabata demostra novamente seu profundo conhecimento da antiga cultura do Japão e enaltece a importância da arte oriental, por meio das cerâmicas seculares do ritual do chá. "

(continua no post abaixo)


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